Para que o mundo seja salvo por Ele.
2020-05-20 10:19:47
7 de Maio de 2020 - Homilia dia da Invenção da Santa Cruz.
Para que o mundo seja salvo por Ele.
Nm 21.4-9; Sl 95.10-13; Phil 2,5-11; Jo 3:17
Queridos irmãos e irmãs!
Que o Senhor vos dê paz!
Neste ano, na festa do encontro da Santa Cruz, as leituras que escutamos ganham um significado especial por causa da pandemia que está afligindo o mundo inteiro.
Desejo refletir com vocês somente um aspecto, que, no contexto atual, me parece ser um aspecto fundamental sugerido pelas leituras que escutamos e na mesma narração do encontro da Verdadeira Cruz.
Trata-se da passagem da experiência da cura à experiência da salvação. É passagem que se faz do olhar a serpente de bronze erguida no deserto a crer no filho de Deus erguido na cruz.
No trecho extraído do Livro dos Números, o povo eleito, durante o seu caminho no deserto, exatamente por causa das dificuldades concretas que encontra, num determinado ponto começam a murmurar “contra Deus e contra Moisés”.
Deus - sempre de acordo com os textos sagrados - utiliza uma forma de correção que diante dos nossos olhos pode parecer muito dura, exagerada, até cruel: envia as serpentes venenosas que mordem as pessoas e muita gente morre. Essa experiência faz as pessoas reconhecerem seus erros: “Nós pecamos! ”
E Deus intervém de um modo estranho: não elimina as serpentes, mas ordena a Moisés de colocar uma serpente de bronze sobre de uma haste. Quem olhava para serpente era curado. O povo eleito fez a experiência de uma salvação que é cura física. Fez a experiência de uma salvação que não é desaparecimento das serpentes venenosas, mas da cura oferecida através deste ato de confiança em Deus, por meio do seu servo Moisés.
Na história do evangelho é o mesmo Jesus que, durante a sua conversa numa noite com Nicodemos, retoma a narração do Livro dos Números e o simbolismo da serpente de bronze levantada sobre a haste. O faz para falar de si e para abrir a uma dimensão de salvação mais profunda do que da cura física, a dimensão da participação na vida de Deus: Como Moisés levantou a serpente no deserto, assim é preciso que seja levantado o Filho do homem, porque quem crer Nele terá a vida eterna. Deus, de fato, tanto amou o mundo que deu seu filho unigênito, para que, quem Nele crer, não morra mas tenha a vida eterna. Deus não mandou o seu filho ao mundo para julgar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele. (Jo 3, 14-17)
A cura física é certamente uma coisa bela. Todos nós a desejamos quando estamos doentes ou quando está doente uma pessoa que conhecemos e queremos bem. Neste período temos rezado e rezamos tanto para a recuperação dos doentes da corona vírus. No entanto, a recuperação física e só um atrasar o momento inevitável da morte. Como o filme do Bergman “O sétimo selo” ambientado durante a epidemia da peste negra de 1300. Em que o protagonista, um cavalheiro, faz uma partida de jogo de xadrez com a morte; sabe que vai ser derrotado, mas tenta retardar a morte para resguardar uma jovem família.
A experiência da recuperação e uma pálida alusão à experiência da salvação, uma frágil analogia do que é a salvação. A salvação não é adiar em algumas horas, dias ou anos a experiência da morte. A experiência da salvação é entrar em uma forma de vida plena, que é fruto da relação pessoal com Jesus, com Aquele que tem a vida em si mesmo, pode doar e pode retomar, que pode e quer compartilhar conosco.
Eu sei que vou morrer, sei também que acolhi Jesus na minha vida, a Sua Palavra e o seu Espirito, e tenho acolhido o convite de me relacionar com Ele, Ele mesmo colocou dentro de mim a semente da vida eterna. A vida eterna e está semeada em mim graças ao dom que Jesus fez dando a vida por mim e passando pelo mistério da morte por amor mim e para levar-me a conhecer o Pai e viver nele.
O Batismo e a Eucaristia, jorraram do seu lado aberto na cruz e me transmitiram sua a vida e este dom da salvação. As Suas palavras, que são espírito e vida, me transmitiram o seu Espirito “que é senhor e que dá vida. ” Há alguns dias, no Ofício das Leituras lemos um estupendo discurso de São Pedro Crisólogo, onde, em um certo momento, este grande pregador e padre da Igreja colocava nos lábios de Jesus Crucificado estas palavras:
“Não temais. Esta cruz não é uma condenação para mim, mas para a morte. Estes pregos não me deram tanta dor, mas imprimiram mais profundamente em mim o amor que tenho por vocês. Estas feridas não me fizeram gemer, mas vos introduziram no meu íntimo. O meu corpo estendido não faz crescer a pena, mas aumenta o lugar de vocês no meu coração para recebe-vos. O meu sangue não foi perdido por mim, mas foi doado em resgate por vós. ” (San Pietro Crisologo, Disc. 108; PL 52, 499-500)
Hoje nós vemos uma humanidade aflita e angustiada, cheia de medo por causa do contágio viral que pode levar doença e morte. Vemos uma humanidade ansiosa em encontrar o quanto antes um remédio para esta pandemia, uma vacina qualquer que alcance a cura. Também nos interessa que a vacina seja descoberta rapidamente, que sejamos curados da doença, que ela acabe. Como disse há pouco rezamos tanto e estamos rezando tanto por isso. Mas deveríamos interessar-nos ainda mais poder fazer a experiência do povo eleito contado no livro dos Números, deveríamos nos interessar em poder fazer a experiência da conversão, de poder viver também a pandemia como um divisor de águas entre um antes e depois, entre um antes de reclamações e e um depois de ter confiança em Deus e de atenção e solidariedade aos irmãos.
Ainda mais deveríamos interessar-nos em fazer a passagem da experiência da recuperação meramente física à experiência da salvação, que nos introduz na vida eterna; que permite de viver com confiança em Deus e com abertura aos irmãos também durante o tempo da pandemia; que nos permita de olhar também a morte como uma experiência pascal e não como o fim de tudo; que nos permita de sentir-nos amados por Deus de modo infinito e também nós mesmos quando nos encontramos imersos no sofrimento humano, quando sentimos que a morte nos engole.
A cura com certeza é uma coisa boa, mas a vida eterna, é sem dúvidas, muito melhor, a participação na vida de Deus. A cura é uma coisa desejável, porém mais ainda mais desejável é a salvação, que vem retirar a nossa existência do niilismo, da angustia e do medo,
e transforma a morte em passagem, em transito, em páscoa.
No final da procissão, perto da edícula do sepulcro, junto do altar de Madalena e da capela da aparição à Virgem Maria canteremos: O cruz, ave spe unica! crux, ave, spes única! / Paschále quæ fers gáudium”
“Ave ó cruz, única esperança, / que leva a alegria pascal”. Ao fim desta reflexão permita-me convidar vocês a fazer uma oração de São Joao Paulo II que inspirou este canto:
“Oh triunfante cruz de Cristo,
Inspira-nos a continuar
A missão de evangelizar
Oh Gloriosa cruz de Cristo,
Dá-nos força para proclamar
e viver o evangelho da salvação.
Oh vitoriosa cruz de Cristo
Nossa única esperança
guia-nos à alegria
e à paz da ressurreição
da vida eterna! Amém."
(Phoenix-USA, 14 settembre 1987).
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